Versos do Bhagavad-gita como ele é

Literatura

Prince-Arjuna-and-Lord-Krishna

Ó filho de Kunti, o aparecimento temporário de felicidade e sofrimento e seu desaparecimento no devido curso, são como o aparecimento e desaparecimento das estações de Inverno e Verão. Surgem da percepção sensorial, ó descendente de Bharata, e é preciso aprender a tolerá-los sem se perturbar.

Ó melhor entre os homens (Arjuna), a pessoa que não se perturba com felicidade e tristeza e permanece firme em ambas é certamente elegível para a liberação.

Aqueles que são videntes da verdade concluíram que não há continuidade para o inexistente e que não há interrupção para o existente. Esses videntes chegaram a esta conclusão estudando a natureza de ambos.

“Sanjaya disse: Vendo Arjuna cheio de compaixão e muito pesaroso, seus olhos cheios de lágrimas, Madhusudana, Krishna, falou as seguintes palavras:

A Pessoa Suprema (Bhagavan) disse: Meu querido Arjuna, como é que tais impurezas se desenvolveram em você? Elas não são próprias de um homem que conhece os valores progressivos da vida. Elas não conduzem aos planetas superiores, mas à infâmia.

Ó filho de Pritha, não se entregue a essa impotência degradante. Ela não condiz com você. Largue tal fraqueza mesquinha de coração e levante-se, ó castigador dos inimigos”.

“Arjuna disse: Ó matador de Madhu (Krishna), como posso contra-atacar, com flechas, em batalha, homens como Bhisma e Drona, que são dignos de minha adoração?

É melhor viver neste mundo mendigando do que viver à custa das vidas das grandes almas que são meus mestres. Embora sejam avaros, eles são não obstante superiores. Se eles são mortos, nossos espólios serão manchados com sangue.

Nem sabemos o que é melhor: conquistá-los ou sermos conquistados por eles. Os filhos de Dhrtarastra estão agora na nossa frente neste campo de batalha. E se nós os matássemos, não nos importaria viver.

Agora estou confuso sobre meu dever e perdi toda a compostura por causa da fraqueza. Nesta condição, peço que Você me diga claramente o que é melhor para mim. Agora sou Seu discípulo, e uma alma rendida a Você. Por favor, instrua-me.

Não consigo encontrar um meio de afugentar este pesar que está secando meus sentidos. Não serei capaz de destruí-lo mesmo que ganhe um reino incomparável na Terra, com soberania semelhante à dos semideuses no céu.

Sanjaya disse: Tendo falado desse modo, Arjuna, o castigador dos inimigos, disse a Krishna: “Govinda, eu não lutarei”, e calou-se.

Ó descendente de Bharata, neste momento, Krishna, sorrindo, no meio de ambos os exércitos, falou as seguintes palavras ao desconsolado Arjuna.

O Bem-aventurado Senhor disse: Falando palavras sábias, você está se lamentando pelo que não é digno de pesar. Aqueles que são sábios não se lamentam nem pelos vivos nem pelos mortos.

Nunca houve um tempo que Eu não tenha existido, nem você, nem todos esses reis: nem no futuro nenhum de nós deixará de existir.

Como a alma corporificada passa continuamente, neste corpo, da infância à juventude e à velhice, da mesma forma a alma passa a um outro corpo depois da morte. A alma auto-realizada não se confunde com tal mudança.

Ó filho de Kunti, o aparecimento temporário de felicidade e sofrimento e seu desaparecimento no devido curso, são como o aparecimento e desaparecimento das estações de Inverno e Verão. Surgem da percepção sensorial, ó descendente de Bharata, e é preciso aprender a tolerá-los sem se perturbar.

Ó melhor entre os homens (Arjuna), a pessoa que não se perturba com felicidade e tristeza e permanece firme em ambas é certamente elegível para a liberação.

Aqueles que são videntes da verdade concluíram que não há continuidade para o inexistente e que não há interrupção para o existente. Esses videntes chegaram a esta conclusão estudando a natureza de ambos.

Saiba que o que penetra todo o corpo é indestrutível. Ninguém é capaz de destruir a alma imperecível.

Só o corpo material da entidade viva indestrutível, imensurável e eterna está sujeito à destruição; portanto, lute, ó descendente de Bharata.

Aquele que pensa que a entidade viva é a que mata ou é morta não compreende. Aquele que tem conhecimento sabe que o eu não mata nem é morto.

Para a alma nunca há nascimento nem morte. Nem, uma vez que exista, ela vai deixar de existir. Ela é não nascida, eterna, sempre existente, imortal e primordial. Ela não morre quando o corpo morre.

Ó Partha, como pode uma pessoa que sabe que a alma é indestrutível, não nascida, eterna e imutável, matar alguém ou fazer com que alguém mate.

Assim como uma pessoa se veste com roupas novas, dispensando as velhas, de forma similar a alma aceita novos corpos materiais, dispensando os velhos inúteis.

A alma nunca pode ser cortada em pedaços por nenhuma arma, nem pode ser queimada pelo fogo, nem umedecida pela água, nem seca pelo vento.

Esta alma individual é irrompível e insolúvel, e não pode nem ser queimada nem seca. É eterna, todo-penetrante, imutável, imóvel e eternamente a mesma.

Está dito que a alma é indivisível, inconcebível, imutável e inalterável. Sabendo disto, você não deve se lamentar pelo corpo.

Se, entretanto, você acha que a alma nasce perpetuamente e morre sempre, mesmo assim você não tem nenhuma razão para se lamentar, ó Arjuna de braços poderosos.

Para aquele que nasce, a morte é certa; e para aquele que morre, o nascimento é certo. Por isso, no inevitável cumprimento de seu dever, você não deve se lamentar.

Todos os seres criados são imanifestos em seu começo, manifestos em seu estado intermediário, e novamente imanifestos quando são aniquilados. Então, que necessidade você tem de se lamentar?

Alguns consideram a alma como algo espantoso, alguns descrevem-na como algo espantoso, e alguns ouvem falar dela como algo espantoso, enquanto outros, mesmo depois de ter ouvido sobre ela, não podem compreendê-la em absoluto.

Ó descendente de Bharata, aquele que habita no corpo é eterno e nunca pode ser morto. Por isso você não precisa se lamentar por nenhuma criatura.

Considerando seu dever específico como kshatrya (guerreiro defensor da sociedade), você deve saber que não há melhor ocupação para você do que lutar sob os princípios religiosos (a luta pela vida); e por isso não há necessidade de hesitação.

Ó Partha, felizes são os kshatryas para os quais tais oportunidades de lutar surgem sem que se procure, abrindo para eles as portas dos planetas celestiais.

Se, entretanto, você não lutar nesta guerra religiosa, então você certamente incorrerá em pecado por negligenciar seus deveres, e assim perderá sua reputação como guerreiro.

As pessoas irão sempre falar de sua infâmia, e para aquele que recebeu honras, a desonra é pior que a morte.

Os grande generais que têm em alta estima seu nome e sua fama pensarão que você deixou o campo de batalha somente por temor e, desse modo, vão considerá-lo um covarde.

Seus inimigos descreverão você com muitas palavras ásperas e depreciarão suas habilidades. O que poderia ser mais doloroso para você?

Ó filho de Kunti, ou você será morto no campo de batalha e alcançará os planetas celestiais, ou conquistará e gozará o reino terrestre. Portanto, erga-se e lute com determinação.

Lute por lutar, sem considerar felicidade ou tristeza, perdas ou ganhos, vitória ou derrota – e, agindo assim, você não incorrerá em pecado.

Até agora declarei a você o conhecimento analítico da filosofia Sankhya. Agora, ouça sobre o conhecimento da Yoga, por meio da qual se trabalha sem almejar os resultados fruitivos. Ó filho de Pritha, quando você agir com tal inteligência, poderá libertar-se do cativeiro do trabalho.

Neste esforço não há perda nem diminuição, e um pouco de avanço neste caminho pode proteger a pessoa do tipo de medo mais perigoso.

Aqueles que estão neste caminho são resolutos em seu propósito, e sua meta é uma. Ó amado filho dos Kurus, a inteligência daqueles que são irresolutos é multi-diversificada.

Os homens de pouco conhecimento estão muito apegados às palavras floridas dos Vedas, as quais recomendam diversas atividades fruitivas para elevação aos planetas celestiais, que resultam em bom nascimento, poder e daí por diante. Desejosos de gratificação dos sentidos e de vida opulenta, eles dizem que não há nada mais além disto.

Nas mentes daqueles que estão muito apegados ao gozo dos sentidos e à opulência material, e que estão confundidos por tais coisas, a determinação resoluta do serviço devocional aos Senhor Supremo não ocorre.

Os Vedas tratam principalmente do tema dos três modos da natureza material. Eleve-se acima destes modos, ó Arjuna. Seja transcendental a todos eles. Liberte-se de todas as dualidades e de todas as ansiedades por ganho e segurança, e se estabeleça no Eu.

Todos os propósitos cumpridos pelo pequeno poço podem cumprir-se de imediato pelos grandes reservatórios d’água. Similarmente, todos os propósitos dos Vedas podem ser cumpridos por aquele que conhece o propósito que há por trás deles.

Você tem o direito de executar o dever prescrito, mas não tem direito aos frutos da ação. Nunca se considere a causa dos resultados de suas atividades, e nunca se apegue a não fazer o seu dever.

Fixe-se na Yoga, ó Arjuna. Execute seu dever e abandone todo o apego a êxito ou fracasso. Tal estabilidade mental se chama Yoga.

Ó Dhananjaya, liberte-se de todas as atividades fruitivas por meio do serviço devocional, e renda-se completamente a esta consciência. Aqueles que desejam gozar os frutos de seu trabalho são avaros.

Um homem ocupado em serviço devocional se liberta tanto das ações boas como das más, mesmo nesta vida. Portanto, esforce-se pela Yoga, ó Arjuna, que é a arte de todos os trabalhos.

Os sábios, ocupados em serviço devocional, refugiam-se no Senhor, e se libertam do ciclo de nascimento e morte, renunciando aos frutos da ação no mundo material. Desse modo, eles podem alcançar o estado além de todas as misérias.

Quando sua inteligência superar a densa floresta da ilusão, você vai se tornar indiferente a tudo que se tem ouvido e a tudo que se há de ouvir.

Quando sua mente já não se perturbar pela linguagem florida dos Vedas, e quando permanecer fixa no transe da auto-realização, então você terá logrado a consciência divina.

Arjuna disse: Quais os sintomas de uma pessoa cuja consciência está assim absorta na transcendência? Como ela fala e qual é a sua linguagem? Como se senta e como caminha?

O Bem-aventurado Senhor disse: Ó Partha, quando um homem renuncia a toda classe de desejos dos sentidos que surgem das invenções mentais, e quando sua mente encontra satisfação unicamente no eu, então diz-se, que ele está em consciência transcendental pura.

A pessoa que não se perturba, apesar das três misérias, não se exalta quando há felicidade, e que está livre do apego, do medo e da ira, chama-se um sábio de mente estável.

Aquele que não tem apego, que não se regozija quando consegue o bem, nem se lamenta quando obtém o mal, está firmemente fixo em conhecimento perfeito.

Aquele que é capaz de retrair seus sentidos dos objetos dos sentidos, como a tartaruga retrai seus membros dentro do casco, deve ser considerado como verdadeiramente estabelecido no conhecimento.

A alma corporificada pode se restringir do gozo dos sentidos, embora o gosto pelos objetos dos sentidos permaneça. Mas, parando com tais ocupações através da experiência de um gosto superior, ela se fixa em consciência.

Os sentidos são tão fortes e impetuosos, ó Arjuna, que eles arrastam pela força até a mente de um homem de discriminação que se esforça por controlá-los.

Aquele que restringe seus sentidos e fixa sua consciência em Mim, é conhecido como um homem de inteligência estável.

Contemplando os objetos dos sentidos, uma pessoa desenvolve apego por eles, e de tal apego se desenvolve a luxúria, e da luxúria surge a ira.

Da ira, surge a ilusão, e da ilusão a confusão da memória. Quando a memória se confunde, se perde a inteligência, e quando a inteligência se perde cai-se de novo no poço material.

A pessoa que pode controlar seus sentidos pela prática dos princípios regulados da liberdade, pode obter a misericórdia completa do Senhor e libertar-se assim de todo apego e aversão.

Para a pessoa que desse modo logrou a misericórdia do Senhor, as três misérias da existência material não existem mais. Em tal estado feliz, sua inteligência se estabiliza de imediato.

A pessoa que não está em consciência transcendental não pode ter nem a mente controlada nem a inteligência estável, sem o quê não há possibilidade de paz. E como pode haver alguma felicidade sem paz?

Assim como um forte vento arrasta um barco nas águas, mesmo um só dos sentidos em que a mente se concentre pode arrastar a inteligência de um homem.

Portanto, ó Arjuna de braços poderosos, a pessoa cujos sentidos estão restringidos de seus objetos é certamente de inteligência estável.

O que é noite para todos os seres é hora de despertar para o auto-controlado; e a hora de despertar para todos os seres é noite para o sábio introspectivo.

Uma pessoa que não se perturba com o incessante fluxo de desejos — que entram como rios no oceano, o qual está sempre sendo enchido mas permanece sempre estável — é a única que pode alcançar a paz, e não o homem que luta para satisfazer tais desejos.

Só uma pessoa que tenha renunciado a todos os desejos para gratificação dos sentidos, que vive livre de desejos, que renunciou a todo sentido de propriedade e está desprovida de falso ego, pode alcançar a paz verdadeira.

Este é o caminho da vida espiritual e divina, depois de alcançar o qual um homem não se confunde. Estando assim situado, mesmo na hora da morte, a pessoa pode entrar no reino de DEUS.

Tradução de A.C. Bhaktivedanta Swami