Um dos mais importantes mestres da escola védica Mayavada, talvez o mais importante deles, foi Shankara, ou Shankaracarya (788-820 d.C.).
Nasceu no Sul da Índia, numa família de brahmanas ortodoxos seguidores de Shiva.
Ainda jovem, tornou-se um asceta e compilou seus dois principais comentários do Vedanta-sutra:
Viveka-cudamani e Sariraka-bhasya.
Viajou muito pela Índia e morreu nos Himalaias, aos 32 anos.
Na época em que o mestre impersonalista Shankara apareceu, o budismo se espalhava por toda a Índia. Porque contava com o apoio do imperador indiano Asoka. Era uma filosofia também impersonalista, porém contrária aos Vedas. Shankara, por sua vez, procurou reformar e purificar a vida religiosa. Ele reafirmou a autoridade das escrituras védicas, as quais a filosofia budista rejeitara por completo.
Segundo o pesquisador da cultura védica Satsvarupa Dasa Gosvami, no livro Introdução à Filosofia Védica, a tradição fala por si (1994, São Paulo: Editora Bhaktivedanta Book Trust), a interpretação da literatura védica estabelecida por Shankara tem o nome de Advaita-vedanta (conclusão não dualista). Ela propõe que a jiva (entidade viva) é idêntica a Bhagavan – a Pessoa Suprema, para os personalistas.
Shankara afirma, portanto, que as próprias jivas são a Verdade Absoluta (Parabrahman), e, em última análise, não há nenhuma individualidade ou personalidade na existência espiritual. Em sua escola filosófica, a suposta individualidade tanto do Ser Supremo quando da jiva é falsa.
Ao negar a pluralidade das jivas, Shankara diverge de todas as escolas védicas ortodoxas. Ele defende também que indagações relativas à origem do cosmo não têm respostas e que a natureza de maya (ilusão) é inexplicável. Para justificar os versos védicos que descrevem Isvara, a Pessoa Suprema, como a causa de todas as causas, Shankara tem uma teoria de que há dois aspectos do Brahman – o puro Brahman impessoal; e o Brahman manifesto no Universo como a Pessoa Suprema.
Shankara reinterpreta a maior parte dos textos suplementares aos Vedas. Ao equiparar jiva e Bhagavan, Shankara contradiz os Puranas e o Bhagavad-gita. As interpretações de Shankara dos versos do Bhagavad-gita se opõem ao sidhanta (conclusão filosófica) claro do Gita, embora o próprio Shankara declare aceitar a autoridade do Bhagavad-gita.
Alguns pesquisadores da filosofia védica consideram os ensinamentos de Shankara um compromisso entre o teísmo e o ateísmo. Pois, com o advento do completo ateísmo da filosofia budista na Índia, restaurar o conceito teísta da literatura védica tornara-se muito difícil, mas Shankara logicamente ajustara-se ao tempo e às circunstâncias. Suas interpretações assemelham-se ao budismo, porém recorrem à autoridade da literatura védica.
Em seus poucos anos de pregação, onde quer que viajasse pela Índia, sua filosofia prevalecia, e a ela o budismo se curvava. Durante um longo período, para muitas pessoas, o Sariraka-bhasya de Shankara foi a explicação definitiva do Vedanta. E ainda é assim para muitos estudiosos ocidentais.
Texto editado extraído do livro Introdução à filosofia védica, a tradição fala por si, de Satsvarupa Dasa Gosvami. 1994, São Paulo: Bhaktivedanta Book Trust.